"Com pedaços de mim eu monto um ser atônito."
Manoel de Barros

quinta-feira, 31 de maio de 2007

Um acidente modificou minha asa esquerda... Ando capengando, e tenho nos meus limites a dor da falta de ser livre...
Ando capengando sem amor, nem amigo pra dar ombro, nem o chá de jasmim colhido de algum jardim chinês... Eu capengo sem essa asa, e com essa falta de algo indescritível, (porque não há palavra que o diga)... Talvez seja falta da outra metade descrita por algum grego, aquela metade afastada de mim (como na música!), talvez Chico Buarque com seus olhos muito verdes me dissesse, de onde vem esse espaço dentro de mim que consegue ser muito maior que eu... Ou talvez eu deva rastejar em busca das respostas em mim mesma, e siga doloridamente sem minha asinha, essa parte arrancada de mim...
Devo dizer que tenho obtido algumas bênçãos, um carinho de noite, talvez a lua seja realmente o que me distrai de ser só...
Estou sentada sobre todas as minhas dúvidas femininas, e no momento me sinto muito frágil. Minha guerreira feriu-se, a espada do amor transpassou meu pequeno coração, quebrou minha asa esquerda, e tirou de mim algo muito valioso, talvez mais valioso que a própria asa... Minha guerreira de repente aquietou-se em mim, (e eu só sei lutar), sigo assim silenciosa a espera de que algo mude, cicatrize esta ferida ainda aberta, e me devolva a vontade de voar mais cedo...
Viver é a arte de sentir-se vivo, sinto-me quieta demais, vou cuidar de mim com chás e acalantos, vou acarinhar minha alma ouvindo o som do mar, e talvez Netuno se compadeça de mim, e com alguma palavra mágica, devolva-me o significado de viver, e a vontade de seguir sendo.
Agora me recolho, dormindo sob o manto sagrado de todas as fogueiras, e diante da Terra refaço os meus votos de ser Inteira, mesmo me faltando tanto...

terça-feira, 29 de maio de 2007

8º dia

Todos os dias, em algum lugar, nós nascemos e morremos.
Silenciosamente o mundo tece sua teia, a vida arde, os espíritos se encontram ou se desencontram buscando o crescimento, mais um degrau, outra etapa cumprida, ou não...
Todos os dias novas questões nascem em nós, como crianças e seus “porquês”.
Nosso interesse ou curiosidade faz de nós pessoas integradas num mundo em que nem todos têm as mesmas prioridades, exatamente porque muitos nem sabem o que exigir, por inocência muitas vezes alguns de nós deixam a vida sem ter dela o melhor que podiam.
Todos os dias o verme do saber deve corroer nossas entranhas em busca de algo “NOVO”.
Só a constatação e o reconhecimento de que nossos Deveres nos conferem Direitos, pode nos salvar de sermos massificados e excluídos. E que isso não nos faça excluir quem não reconhece esses direitos, mas nos ajude a defender e guiar estes.
Todos os dias nos deparamos com injustiça, violência, e a banalidade das agressões gratuitas. Cabe a nós não desacreditar em possíveis mudanças, e a reação de pensar mais, é uma grande arma. Uma arma que governo nenhum pode nos tirar.
Todos os dias, também encontramos caridade, amor, amizade, e a salvação que pedimos, como se esta estivesse sempre a um passo de nós.
E este lugar onde nascemos e morremos, pode ser dentro de nós, ou na China dentro de algum chinês, ou em Angola, afinal somos todos feitos do mesmo frágil material. Quando morremos, levamos conosco o sopro divino que nos manteve aqui, e o que deixamos é tudo pelo que lutamos. Cabe a cada um decidir o que quer deixar atrás de si. Eu quero um mundo melhor para meus netos e todos os que os seguirem, e para os netos dos angolanos e chineses e todo o resto do mundo, porque nada somos além de irmãos.
Todos os dias quando acordo eu me questiono sobre o que estou fazendo aqui, e acho que tenho feito muito pouco. Talvez algum dia alguém leia estas linhas que agora escrevo, e sinta-se comprometido, e me ajude a ajudar, e passe essa mensagem a outro que passe a outro, e quando menos se esperar muitos a tenham lido, então não terei vivido em vão, e ao escrever neste papel terei feito um pouco do muito que tenho sonhado, e a minha utopia não se perderá com meu corpo que ficará misturado ao pó da Terra, como num pacto de amor eterno.

segunda-feira, 28 de maio de 2007

Pequenos gestos... grandes ameaças?!

Hoje sobrevoei uma sala...
Eu sei quão pequena eu sou, mas houve um momento de gritos, e um pavor tomou conta da sala. Um grande gato pulava pra lá e pra cá, eu simplesmente não podia entender o porquê do alvoroço, de repente me dei conta de que “EU” era a grande ameaça!
Minhas asinhas livres e coloridas assustavam aquelas pessoas e aquele grande gato.
Fui atacada pelo gato inocente, pobrezinho... Ele sentia-se tão amedrontado que a melhor forma de me dizer isso era me atacando.
Continuei batendo minhas asinhas, até que uma grande mão humana me colocou sobre um vasinho de flores, talvez querendo me salvar daquele gatinho assustado. Senti um grande alivio ao ser protegida, o calor daquela mão e a cumplicidade que compartilhamos em breves segundo me fez acreditar em verdades antigas, como amizade, amor, caridade.
O mundo às vezes assusta-se com o que somos.
E nós nos assustamos com o mundo, quando ele quer nos dizer algo, de uma maneira que não conseguimos decifrar.
Talvez um dia todos estejamos prontos para aceitar quão semelhantes somos, não importa quão diferentes sejamos...
Em diversos paises nascem todos os dias milhares de crianças, borboletinhas saídas de seus casulos, e o que nos pedem?
Brincar entre gritos de alegria, voar em seus pequenos mundos. Quando pequenos sentem-se iguais e amam-se. No entanto em algum momento passam a desentender tudo, e imaginam que aprenderam a ser grandes ao reconhecerem diferenças. Aquele Grande gato assustado achou-me diferente dele, simplesmente por eu possuir asas, e atacou-me por isso. Era uma sala bem grande aquela, e eu simplesmente voava.
Diferenças são difíceis de entender, mas às vezes precisamos apenas olhar um pouco mais o objeto do nosso espanto para perceber nele algo que realmente nos assusta, e combater em nós mesmos a repulsa ou o preconceito. Devemos aceitar e respeitar as diferenças de outrem, como esperamos ser aceitos e respeitados. Às vezes pode surgir uma grande mão para nos ajudar, outras vezes podemos contar apenas com a sorte. Mas seria muito bom contar com a caridade humana, e a solidariedade de um mundo em que todos são livres para ser aquilo que desejam ser, sem que isso sirva de ofensa para outros.
Eu continuo aqui, ensinando minha filha (pequena borboleta ainda) a ser livre, e a amar seus amigos, e compreender seus inimigos, porque todos merecem ser amados.
É no nosso jardim que começo hoje a mudar o mundo.

6º dia... voando...

Que liberdade é essa de viver tudo que posso, e ainda assim me sentir presa a algo, como se eu estivesse o tempo todo no limite, buscando impossíveis, mesmo agora, eu tento escrever sobre o que eu não conheço... Não sei o que desejo, só sinto um desejo enorme por alguma surpresa, algo que me tire do eixo, e essas surpresas não acontecem... A não ser dentro de mim mesma. Gostaria que alguém fosse tão especial quanto esta imagem que eu criei, mas eu sei que é só uma imagem, e que eu posso encontrar milhares de pessoas no mundo e pode ser que nenhuma corresponda ao que eu desejo... Mas por um milagre, coincidência, ou chamem do que quiser, pode ser que eu encontre este alguém imaginado! Pode haver surpresa, tremores, bagunças, alegrias, dores, pode haver um tumulto de sentimentos, e pode ser real... Então não vou ter criado em vão... Minha mente está alerta, meu corpo bailarino pelo mundo, como numa dança de ser feliz, profundamente feliz.
Que liberdade é essa de viver absolutamente, e ainda assim, ter certeza que nada no mundo me deixaria mais livre, do que o amor deste ser tão especial.
Liberdade... Amor... Em que lugar nós vamos nos encontrar... Onde teus olhos vão encontrar meu riso, sempre antes do meu coração... Onde.

Fim de inverno é assim...

O inverno está no final...
Promessas de um belo verão,
eita liberdade boa!
Ser tudo que eu posso, e que eu devo. Não rastejar, e também não pisar nas pessoas, apenas, amá-las, como todos merecem. Uma candura viver assim. Barulho de chuva invade meus pequenos ouvidos, o cheiro da terra sendo lavada, e as flores recebendo a chuva, amanhã de manhã vou logo colher-lhes o pólen, vou sobrevoar o mundo bem do alto, e observar a pequenez de que somos todos feitos.
Olho ao redor. Neste fim de inverno eu também sou o inverno, algumas coisas o tempo levou de mim, o vento fez bagunça nas árvores... O frio tenta emudecer as tardes...
Aí o barulho da chaleira, há um chá que deve ser servido, um segredo de amigas que vai ser sussurrado, talvez algum vexame ou delito leve... Quem sabe...
Espero pelo sol que virá me trazer o calor do seu abraço, tardes cobertas de suor, e as noites de um céu negro feito os olhos do amor primeiro.
É suave o fim do inverno, retiro de mim coisas esquecidas nos cantos,
renovo meu olhar,
meus desejos renovam-se...
Fim de inverno...
No verão promessas de ser feliz...
Muito.
Que eu mereço!

4º dia...


Há uma luz iluminando o lado direito do meu corpo, do lado esquerdo faz sombra, então, chego à conclusão que, por maior que seja a luz que nos atinge, a dor, o amor, se somos inteiros, em algum lugar em nós ainda fica uma sombra, como para nos lembrar que nada é fixo, nem o amor nem a dor...
Logo a luz pode mudar de lugar, ou nós mudamos, e assim crescemos, adquirimos alguma sabedoria ou alguma frustração.
Escolhemos ser luz ou sombra...
E neste ponto reside nosso verdadeiro poder: o de decidir, escolher o que queremos realmente ser, como desejamos viver e com quem desejamos partilhar nossa vida, família, amigos, amores.
Eu escolho a luz do amor, escolho teus olhos na noite, a calma do abraço, a cumplicidade do silêncio dizendo carinhos... Vez em quando eu sou sombra, uma dor que invade meu corpo, uma febre...
Quase falta o ar...
Ainda assim, me sinto livre pra escolher o que me faz feliz, cheiros, gostos, você.
Algumas escolhas não dependem só de mim, e fico a mercê de um mundo em que eu nem sempre tenho razão.

sábado, 26 de maio de 2007

3º dia...

Hoje é dia de trabalho...
Acordo... Banho... Correria... Mas, deslizo entre xícaras de café e celular... rs
Eu sou moderna!!!!
Borboleta saída de algum lugar em mim... Levemente doida...
Andei incomodando pessoas com meu jeito desleixo, meu cabelo muito curto... Respiro!
Aí bato as asas, mudo meu rumo, sigo projetos nos quais ninguém acredita, porque é difícil ser eu?!
Agora que respirei ar novo eu quero amor novo, depois máquina de fotografar nova, depois invento outro algo novo pra querer, porque é muito bom querer, quando eu quero algo profundamente, minha alma bailarina trabalha para realizar este desejo, e meu corpinho move-se ao som de uma música que chamamos “esperança”, amor novo!
Andei sonhando com crianças... a criança em mim quer dançar, pintar casinha e sol, colher pólen recém nascido de flor nova... Eu imagino como é ser gente, ferindo-se em espinhos de rosas vermelhas, somente para apreciar um sorriso de alguém que amamos, e depois colher desse alguém um carinho doce, imagino como é andar de bicicleta aos domingos e em quantas alegrias pode-se viver em momentos tão especiais... E imagino que talvez haja alguém que não note, não saiba dessas alegrias pequenas, e passe despercebido entre elas, como um grande besouro muito veloz...
Hoje é dia de trabalho.
Eu borboleta... zum...zum...zzzuuuuuuuummmmmmm...
Delícia estar viva, e aqui!

sexta-feira, 25 de maio de 2007

De Lagarta a Borboleta


Um barulhinho na janela é o sol, me acordando com abraços.
Me sinto zonza, o dia é novo como a minha vida agora... Faço silêncio, escuto, olho ao redor, hoje eu deixo pra trás esta casa, deixo de viver fechada e vou ser livre!
Abro os olhos lentamente, para acostumar-me a nova condição. Minhas asas doem, e eu que nem sabia que as tinha... Sinto-me invadida pelo desejo de voar, não mais rastejar entre estas paredes, mas voar... Tomar posse dos meus sonhos, me alimentar do pólen das flores. Eu não conhecia esse desejo, e só agora me dou conta de que preciso tanto ser livre...
Num rasante me sinto de novo enjoada, a cabeça gira como num carrossel veloz, estou doida. Não. Eu estou sendo eu mesma, e encostada na cama sorrio da minha falta de experiência em ser eu. Arrumo as coisas que estavam soltas pelo chão, vou sei lá pra onde, ser feliz aos pouquinhos, porque tudo é novo pra mim. Levo as lembranças do meu casulo, as tardes em que servi chá para algumas amigas, as conversas mudas segredando mistérios de cada uma, a cumplicidade que só o amor é capaz de oferecer. Levo ainda, o cheiro das crianças recém nascidas, um barulho de risos, beijos de pai e mãe.
Eu me sentia bem quando era lagarta, pra lá e pra cá com meus afazeres, achei que era suficiente, não correr o risco, ser boa o bastante e nunca ser má. Ai! Mas eu quis ser má uma vez apenas, quis gritar um palavrão, quis quebrar uns pratos e dizer que eu não era aquela, eu quis muito ser feliz como eu achava que podia, e talvez esse tenha sido o primeiro passo da minha metamorfose: O DESEJO DE MUDAR.